Flor e Guitarra
Maria Flor, moça linda, que tinha mimos guardados
E os homens lá do povoeiro queriam ter Maria Flor no seu costado
Teve tantas serenatas em frente a sua janela
Que acostumou-se as cantigas que ali cantavam pra ela
Escutava a cada dia - sem pôr os olhos pra fora -
Os versos doces de amor que rimavam mais de hora
Depois ouvindo o silêncio, lembrando das melodias
Levava a mão junto ao peito e, sorrindo, adormecia
Que ali sonhava, se soube - assim andaram dizendo
Mas o que os sonhos guardavam nunca alguém ficou sabendo
Outro dia ouviu um canto - mais outro feito pra ela
E diferente de sempre chegou abrindo a janela
Firmou os olhos no moço, depois um nó no vestido
E se foi de alma entregue com o coração já rendido
E cruzou sobre a soleira em busca daquele abraço
Eu quero ser tua guitarra, varar a noite em teus braços!
Sorrindo o moço a levou, e jurando amor seguiu
Que anoiteceram os dois num rancho costeando o rio
Não esperava por certo, fosse entregar seu amor
Pra ser ferida com espinho e, então, perder sua flor
Naquela noite estrelada e de lua cheia também
Eles dormiram abraçados e ela acordou sem ninguém
Desde então foi que Maria perdeu-se por esse mundo
E todos sabem quem é, mas ninguém conhece a fundo
Poucos vêm a solidão que reflete em seu olhar
E até a falsa esperança de um dia voltar a amar
Sabem que espera à janela, por algum serenateiro
Com uma nova cantiga pra entregar-se por inteiro
Quem tanto quis ser guitarra feito uma vive agora
Passando de mão em mão - quem sabe, o destino, adora!
Quem chega em sua janela na cruel verdade esbarra
Maria, a Flor, foi-se embora, ficou Maria Guitarra!