Covardia
O sol do velho porto
Ainda cochilava.
E o vulto pequenino estava lá;
Pequenas mãos vazias;
Às vezes, cicatrizes;
E o brilho da inocëncia no olhar.
Corria no canteiro
E se olhava nos espelhos;
Pra ele, a vida abria no vermelho!
“Ôh tio, dá uma mueda!
piquena, podi sê!
Só pru meu pai não batê.”
E, no verde dos seus olhos,
Veio o verde do sinal;
E a vida continuou, na capital.
Afinal, quem liga
Se uma vida se profana?
O caso é tão comum na selva urbana!
É só mais uma covardia humana!
E o sol do velho porto
Deitou-se, em muitas tardes,
E o vulto do menino estava lá!
Mas mãos, uma pistola!
Corria no canteiro;
E todos o chamavam Sarará!
E, nas manhãs cinzentas,
Foi manchete de jornal:
"O Sarará matou na capital!"
E, em breve o povo, alegre,
Corria a comentar:
“Mataram o bandido Sarará!”
E o verde dos seus olhos
Se fechou, como o sinal;
E a vida continuou, na capital.
Afinal, quem liga
Se uma vida se profana?
O caso é tão comum na selva urbana!
É só mais uma covardia humana!
E o sol do velho porto
Deitou-se, àquela tarde,
E o corpo do menino estava lá!
E olhando em meu espelho,
No fim daquele dia,
Eu vi a minha própria covardia!