Toal Proibido
E a cada passo, eu deixo um passo na calçada esburacada
E ocupada pela pressa e pela calma disfarçada
Por quem carrega seus traumas, sem controle sobre a alma
Todas as tias cansadas que trabalham na batalha
Esse é o toal meu paraíso, lugar aonde eu vivo
Onde eu cultivo a minha arte a cada metro aonde eu piso
Cada rua, cada prédio, cada carro, cada grito
Cada choro, cada vida, cada lágrima e sorriso
Todos são sujeitos à isso aqui no toal proibido
É como a palma da minha mão mas já me senti tão perdido
O lugar onde eu habito, explorado pelos gringos
No domingo eu exploro, um simples pingado no seu rodrigo
Passo em frente ao mister lanche, vários nomes no higino
Ratos da localidade, andarilhos eu imagino
De segunda à segunda-feira pros que ficam de bobeira
Quem toma conta de carro e quem trabalha na feira
Eu me sinto no paraíso misturado com inferno
Tudo que acontece aqui é relatado em meu caderno
Viva um pouco mais aqui antes de achar que não é nada
No paraíso de terê tem muita criança jogada
Abandonada vem pra cá, tentar arrumar um trocado
Tomando conta de carro, se entupindo de cigarro
Pergunto se é contra isso que trabalha o juizado
Enquanto eles dormem no ponto, os menor tão revoltado
Pra quem vem na ferinha, o toal é passatempo
Mas o tempo já passou e é só agora que eu entendo
Os momentos de infância, dos tempos na moral
Do campinho da tia lena, timão do sideral
Na real, tempo que o meu avô era vivo
Barraca do zé dibinha quem viveu sabe o que eu digo
Hoje em dia no toal o que eu posso dizer:
Frio pra carái e nada pra fazer
Coé drol, arruma a inteira do mel
Bora lá mafu um nofi na casa do rafael
Tédio do carái esse tempo é mó chato
Então já é neguim, só vou botar um casaco
O inverno é violento é bom sair agasalhado
Pode chover canivete que o coreto tá lotado
De longe um ataúl, neguim já me avista
Os guardinhas ficam tenso olhando com cara de autista
Mas antes do primeiro freestyle, e a primeira revista
Rep no dagim incomoda os taxista
Que se foda esses maluco, mó cambada de cuzão
Eu vou continuar aqui olhando os carro chapadão
Olhando o djavan doidão, para sentado no chão
Com a mente não sei aonde, um copo de cana na mão
Parece engraçado nem sei se é notado
O carlinho deitado pedindo um trocado
Culpado ou coitado, mais um viciado
Mas quem sou eu pra falar, eu também tenho os meus pecados
O pico é variado, tem pobre, tem rico
Tem emo, viado, playboy, mendigo
Tem muito vagabundo, muito trabalhador
Mercenária, vacilão também tem vários pixador
Mas o meu bairro é diferente, perigoso e atraente
Lugar de gente decente, gente doida e delinquente
Chego no coreto errado bate com a língua nos dentes
Aqui é o jardim do éden em meio ao ninho de serpente
Sábado o dia tá quente, partiu, parque nacional
Fumar um e dá um tibum, é fundamental
Um alô especial pra minha comunidade
Fernandinho, gogrin temos muitas saudades
Deus te guarde em bom lugar, eu sei que tu está
A cachoeira agora é chato sem vocês pra gastar
Fernandin faz um favor pra mim e pros amigos meus
Diz que estamos com saudades dá um abraço no matheus
Cês tão fazendo falta, mas, cês tão no coração
Ter conhecido esses amigos foi mó satisfação
Nessas horas que eu vejo, que o tempo passa e eu nem percebo
Eu me deparo de cara com o mundo, sentado no soberbo
O toal fora isso, é tranquilo de se viver
Triste é ver segunda-feira as mães na 110 dp
Aqui é descriminalizado porém tem sua lei vacilou vai ser cobrado
Aqui é meu sustento onde adquiro conhecimento
Quem não conhece o alto, não sabe o que tá perdendo
Um abraço lá pro torto, ilha do caxangá
Cascata dos amores, taumaurgo, ingá
Fátima, araras, soberbo, pedreira
Granja guarani, "rá rá" tá de bobeira
A cada passo eu levo um traço da lição que me foi dada
Leve com a alma lavada, um artista da madrugada
Eu sou levado pelos ventos do meu bairro que me abraçam
E me diferenciam de tolos que por mim passam
E falam, gritam, mas somem de repente
Aonde era mato agora são prédios na minha frente
A humildade prevalece mas eu vou me destacar
Tem horas que é melhor ficar uns aqui e outros lá
É foda, neguim tem que saber se comportar
Não é só beber cachaça na praça a começar a gritar
Fazer o que né, cada um sabe o que faz, né
Os nacã vão chegar ai, ó, bora meter o pé
Vou dar um rolé na casa de cultura, não sei aonde
Cascata, rua do menor ou na ponte
Aonde quer que eu vá eu represento como eu posso
Então vamos preservar neguinho, que o bairro é nosso
Eu ando nesse bairro como o sangue corre em minhas artérias
Esse lugar me traz inspiração e novas ideias
Ideias tão brilhantes, quanto a luz do poste que ilumina
Na esquina que nós para sempre pra mandar um rima
Pra mostrar que todos tem o seu lugar
Vai ser bem recebido se souber chegar
Cada calçada desse bairro tem uma história pra contar
Mas, é o que o sol já vai raiar e eu não posso parar
Eu vou pra casa em paz, mas, fugindo desse caos
Aos que plantaram ou colheram os seus frutos aqui
Suas derrotas, vitórias, suas histórias aqui
Aos que nasceram, se criaram e que moram aqui
Aos que passaram, que viveram, deixou saudade aqui